Biografia: "A Pietà do Lixo - Dona Domingas" Campanha de financiamento coletivo para publicar a biografia de Dona Domingas. A catadora de papelão que virou estátua sem uma história para a posteridade.
O nosso projeto é publicar a biografia de dona Domingas, Ex-escrava e catadora de papelão em Vitória/ES, que tem sua estátua ao lado do Palácio Anchieta, sede do governo capixaba. Chegou ao estado no mesmo ano da visita do imperador Pedro II (1860). Em 1951 o escultor italiano, Carlos Crepaz, fez a sua estátua. Em 1971, ela foi colocada ao lado do Palácio. Infelizmente, até hoje não tem uma biografia ou mesmo uma placa que a identifique. O mais interessante é que se trata da única estátua do mundo de uma pessoa pobre que virou estátua sem uma biografia. O escultor fez mais seis estátuas de dona Domingas. Uma delas está no Museu de Belas Artes do Rio de Janeiro desde 1959. Na biografia colhemos dezenas de depoimentos de pessoas que a conheceram em suas caminhadas pela cidade. São histórias locais e nacionais que dona Domingas presenciou: - A vida como escrava, a liberdade e fatos que contava nas indas e vindas pela cidade. A gênese da biografia de dona Domingas. A Pietà do Lixo – Dona Domingas Quando chegamos na cidade de Vitória, capital do Espírito Santo, no ano de 1983, começamos a visitar seus monumentos. Vimos várias estátuas e bustos: Iemanjá, Araribóia, Menino com Delfim, Getúlio Vargas, Domingos Martins, Muniz Freire, e muitos outros espalhados pela cidade com as devidas placas e suas inscrições. Uma dessas estátuas de bronze nos chamou a atenção pelos detalhes da textura do cabelo, face e vestimenta quase reais: Uma senhora negra, corcunda, descalça, levando um saco nas costas e um cajado nas mãos, trajada com uma roupa preta pesada de andar lento. Aparência de uma pessoa sofrida pelos traços faciais: rugas e olhos caídos. Estava posta numa das ruas laterais do Palácio Anchieta, sede do governo capixaba. Intrigante é o local onde foi instalada. Numa pequena área triangular ao “pé” da escadaria Bárbara Lindenberg, acesso ao Palácio. Como “coisa concreta”, fixa, a escultura se integra àquele desenho urbano, mas não se coloca como formadora de identidade do lugar. A exuberância do Palácio e sua escala se sobrepõem ao da estátua e da praça apensada ao seu contexto. A relação da obra de arte com o lugar é paradoxal. Seu caminhar lento não combinava com o intenso trânsito de pedestres e veículos no local. Aparentava participar da confusão do centro ao seu redor, sendo apenas mais um dos inúmeros transeuntes ali presentes diariamente. Procuramos sua identificação por todos os lados, e até usamos, sem exagero, uma lupa! Aproximadamente uns dez minutos: – E nada! A estátua não apresentava sequer uma linha de quem seria. A mente nos veio uma pergunta: Uma estátua sem nome ao lado do Palácio Anchieta, sede do poder executivo, a frente do Porto de Vitória, na entrada da Cidade Alta, sem referência? Perguntamos a algumas pessoas se sabiam o nome da estátua. Para nossa surpresa, as respostas ficaram nos: eu acho; eu não sei; eu nunca tinha visto! Uma dessas pessoas até soltou uma interjeição: Ó! Passo por aqui quase todos os dias e desvio pensando que era um poste! Por alguns instantes ficamos a olhar o horizonte sem saber se estávamos ao norte ou ao sul. Naquele momento uma frase surrada da historiadora Viotti da Costa, volveu a mente: “Um povo sem memória é um povo sem história. E um povo sem história está fadado a cometer, no presente e no futuro, os mesmos erros do passado”. Consultamos o relógio e, ironia do destino, marcava em nosso calendário gregoriano, dia 19 de agosto, dia do Historiador. Naquele momento de reflexão uma senhora que passava nos interpelou: O senhor está admirando a estátua de dona Domingas? Prontamente, perguntamos: A senhora conhece a estátua? Sem titubear, sorriu e disse: Não só a estátua, bem como a dona Domingas. Demonstrando ares de um pretérito perfeito, discorreu algumas palavras: Ela foi catadora de lixo que morava no Bairro de Santo Antônio. Passava o dia a pegar papelão e só voltava para casa ao anoitecer. Eu a vi muitas vezes pela cidade. Um bom dia e um bom trabalho era o nosso bate papo. Foi esculpida por seu vizinho, o escultor italiano, Carlo Crepaz, que mantinha seu atelier no Bairro de Santo Antonio. Pouco se sabe da vida de dona Domingas. Dizem que ao ser esculpida por Carlo Crepaz, ele se tornou o seu maior confidente. Terminado, a senhora nos disse: - Uma pena que não tenha uma Biografia! Apenas virou essa estátua fria, de bronze e sem vida! Talvez por piedade ou dor na consciência a colocaram ai! Aquelas palavras nos tocou o coração: Sem biografia...virou estátua fria de bronze e sem vida! Naquele momento encerramos a conversa e o incomodo permaneceu em nossa mente por três décadas. Finalmente, em 1983, ao ver alguns turistas no mesmo local, tentando identificar a estátua, não pensamos duas vezes! Buscamos saber quem seria em carne e osso, dona Domingas. Enfim, começamos a percorrer o caminho “das pedras” para escrever esta biografia que, certamente mostrará a vida de uma mulher, negra, pobre,. A única catadora de lixo, esculpida em bronze no mundo. Um pouco de Dona Domingas Sua família veio de Açores na segunda metade do século XIX e foram morar no morro do Palácio. Permaneceram por algum tempo. Dona Domingas e sua irmã Olíria gostavam de pegar caranguejos nas águas que batiam perto do Palácio, onde hoje é a escadaria. A mãe de dona Domingas não pode dar um estudo digno aos filhos. Na época os poucos colégios que tinham ao redor do Palácio eram para as famílias mais abastadas. Mesmo assim o imperador Pedro II escreveu em suas anotações em visita a escola professora Vitória Antunes da Penha : (janeiro de 1860) "Aula de meninas de Vitória Antunes da Penha. 16 matriculadas. 14 de frequência. 1.ª lê mal; gramática nada; multiplica só. Há 5 ou 6 meses; mas já tinha algum estudo. A professora já serve aqui na Vitória quase 5 anos. 2.ª lê hesitando muito – nada de gramática; multiplica só. Há 8 meses; já tinha estado em aula particular. Nada sabem de doutrina e a professora parece má. E essa impressão não mudou muito na adolescência de dona Domingas. Com dez anos de idade a irmã Oliria já dizia que havia nascido livre. Ela se referia a Lei do Ventre Livre de 28 de setembro de 1871, assinada pela Princesa Isabel. Portanto, podemos deduzir que nasceu em 1881. Em 13 de maio de 1888 foi a vez de dona Domingas festejar a sua liberdade. Circulava em Vitória que a Princesa Isabel tinha extinto a escravidão no Brasil pela Lei Imperial número 3.353. Dizia o artigo primeiro da Lei: “É declarada extincta, desde a data desta Lei, a escravidão no Brazil.” (Grafia da época). Do morro do Palácio a família assistia à comemoração dos ex-escravos que se estendia pelas ruas de Vitória. Segundo relatos da época, dona Domingas, já tinha personalidade forte e sempre perseguiu seus objetivos. Ela dizia - " Fui escrava. Hoje sou livre e serei assim até os meus últimos dias". Dois anos depois foram morar no morro do Pinto no Bairro de Santo Antônio. Finalmente, tiveram um lugar definitivo para morar. Tão logo, foram trabalhar como catadeiras de café em grãos no armazém de café da firma alemã Tordovilli. O Gerente da fábrica se chamava Álvaro de Andrade Leitão. Ele dizia que Domingas e Olíria eram felizes. Enquanto separavam os grãos passavam o tempo a cantar. Foram pessoas exemplares, muito diferentes de muitos que ali trabalhavam. Pouco depois, Olíria foi convida a trabalhar na casa da filha de Álvaro, dona Carmen. Segundo dona Carmen, Olíria, foi sua lavadeira nos anos 70. Ela pegava as roupas e levava para lavar e depois as trazia. No morro do Pinto, gostavam muito de frequentar a igreja de Santo Antônio. Ajudavam o próximo na medida do possível e os padres faziam o mesmo por elas. Dona Domingas não faltava na missa das 18 h, vestida de preto de sapatos e meias, terço na mão e em oração sem muita conversa. Todos admiravam a sua postura, em especial os padres Virgílio e Mateus. Mesmo vivendo entre o “lixo e o luxo”, nunca foram pedintes ou mendigas como muitos pensaram. Em sua biografia, vamos trazer relatos de parentes e pessoas que conheceram dona Domingas que até hoje adormece como estátua, sem inscrição e sem uma Biografia. Aliás, a Escultura esculpida por Carlos Crepaz é denominada de “O Anoitecer”, como está registrada no Museu de Belas Artes no Rio de Janeiro (1959) O nome dado por Crepaz, revelaremos na biografia. Não é um monumento em homenagem ao “Trabalhador Negro”, quando em 1971 a estátua fora inaugurada pelo prefeito. Em Tempo: Quando temos a histórias, não devemos contar “estórias!” Colabore com publicação da Biografia de dona Domingas. A Pietà do Lixo. A única escultura do mundo de uma catadora de lixo e sem uma digna biografia.

Comentários

  1. Que projeto magnifico. Realmente, dona Domingas nunca teve uma história contada em livro. O mais lamentável é virar estátua sem nenhuma referência. Meus Parabéns. Me passe o número da conta, pois não estou conseguindo pelo site da benfeitoria.

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    1. O livro já está publicando na Editora Clube dos autores.

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  2. Eu simplesmente amei, e vou colaborar com certeza para que a biografia dela seja publicada, poderia colocar a referencia na estatua, ia ser tooop

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  3. Conheci esta senhora, foi minha vizinha no Morro do Pinto, Santo Antônio. Era de pouquíssimas palavras, dependendo da cor da pele, ela dizia: não falo com branco, minha irmã primogênita falava isto. Eu particularmente, não gosto deste Rótulo: Pieta do lixo, pois, eu a considero como Precursora da Reciclagem, ela não era catadora de lixo, cantava somente Papelão e, os vendia, já naquela época, era matéria prima da indústria de transformação. Outro detalhe, não esmolava, na antiga Rua ou Beco da Miséria, centro de Vitória, era vista catando papelão, ali havia o SAPS, Serviço de Alimentação da Previdência Social, foi uma Autarquia instituida em 1940, em fins do primeiro Governo de Getúlio Vargas. Trabalhava sol-a-sol, pois, neste local era fonte de geração de muitas caixas de papelão devido às compras da Instituição.

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  4. Gente, tenho interesse no livro!!!

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